Bibliomóvel, do FB de Nuno Marçal
Regressada a casa após os XIX Caminhos de Leitura, é tempo de refletir sobre o vivido, lido e aprendido durante esses dias em Pombal. Creio que esta edição ficará para sempre gravada na minha memória / no meu coração, não só pela necessidade que todos nós, promotores e mediadores do livro e da leitura, sentíamos de estarmos novamente juntos de verdade, mas também, e sobretudo, pela qualidade do programa desenhado pela Sónia Fernandes, do Município de Pombal, e por toda a sua equipa. Um abraço muito grato a todos!
Ao longo dos próximos dias, irei escrever aqui sobre este Encontro de Literatura Infantojuvenil. Começo hoje com um elo que ficou a faltar no primeiro dia. A 23 de junho, após a conferência de abertura da professora Eliana Yunes, coube-me moderar o painel LEITURAS E LUGARES: PROJETOS E PRÁTICAS DE LEITURA. No palco, estiveram Rose Carneiro e Emanueli Unfer (Trilhos da Leitura - Rio Grande do Sul), Ana Sofia Marçal (Festival Literário "Maratona de Leitura"), Pep Duran Oller (Ler no Bosque - Bibliobosc al Montseny) e Elsa Serra (Na Rua com Histórias), que nos apresentaram os seus projetos inspiradores.
Porém, ficou a faltar alguém. Do programa inicial constava o Nuno Marçal, que nos iria falar da sua Bibliomóvel. Por motivos pessoais justificadíssimos, o Nuno avisou a organização de que afinal não poderia estar presente. Por considerar o seu trabalho tão importante, eu não queria perder a oportunidade de o ouvir falar sobre a Bibliomóvel e as terras e gentes de Proença-a-Nova. Aqui ficam, acabadas de chegar esta manhã, as importantes e necessárias respostas do Nuno às questões que lhe coloquei, para que possam ser lidas e relidas, e chegar ainda a mais pessoas do que as que estavam no dia 23 no Teatro-Cine de Pombal. Obrigada, Nuno! As tuas respostas apontam o caminho para o futuro das bibliotecas. Que continues a contagiar-nos com o teu exemplo inspirador!
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Bibliomóvel, do FB de Nuno Marçal |
Qual a ideia / necessidade que te levou a começar o projeto "Bibliomóvel"?
A Bibliomóvel surgiu de uma candidatura que o Município de Proença-a-Nova, em parceria com a Santa Casa da Misericórdia de Sobreira Formosa, efectuou ao Programa Progride do Ministério da Segurança Social, em resposta aos grandes incêndios de 2003 que destruiram grande parte da mancha florestal do concelho. Essa candidatura, além da Bibliomóvel, incluiu uma Unidade Móvel de Saúde. A necessidade destes projectos prendia-se com o levar serviços de proximidade (cultura, saúde e sempre algo mais) a populações afectadas pelos incêndios florestais.
A Bibliomóvel entrou ao serviço no dia 26 de junho de 2006 e mantêm-se até hoje com esse objectivo de ir, estar e dar Biblioteca Pública sobre rodas a TODAS as Pessoas, as que sabem ler, as que não sabem ler e as que não querem ler. TODAS as Pessoas!
Como é o território e a população que serve?
O concelho de Proença-a-Nova é um território ultra-periférico da periferia geográfica de Portugal, com cerca de 7000 habitantes, eminentemente rural com povoação dispersa por pequenas aldeias e cujas características principais são o envelhecimento e a desertificação. Apesar de tudo isto, conseguem manter a genuinidade, a bondade e a imensa hospitalidade das boas Pessoas e sou um afortunado por conhecer e privar com elas.
Quais as principais características / valores deste projeto?
Proximidade, Periodicidade, Cumplicidade, Intimidade e Amizade. Creio que são estes os valores desta Biblioteca Pública sobre rodas atenta às necessidades e vontades da comunidade onde anda e trabalha. As Bibliotecas para sobreviverem e reconquistarem a relevância e a importância que tiveram e têm vindo a perder são aconselhadas/obrigadas a isso mesmo, estarem atentas não se fecharem dentro das suas ameias e muralhas e trabalharem quase em circuito fechado tantas vezes para um quase imenso vazio e silêncio. As Bibliotecas têm de ser úteis para a comunidade, só assim conseguem que seja essa mesma comunidade a participar e acima de tudo a defendê-las das imensas ameaças que pairam sobre elas.
Alargar o espectro funcional, sem sair obviamente da sua matriz de identidade como Casas de Liberdade, Igualdade e Fraternidade onde o livre acesso à informação e conhecimento credíveis e verificados, espaços de encontro, de partilhas, de ajuda, de formação, de encanto e deslumbramento e sempre algo mais para TODAS as Pessoas tem que fazer parte obrigatoriamente do cardápio de actividades e funções das Bibliotecas Vivas!
Que balanço fazes do trabalho até agora realizado e quais os próximos passos?
Passaram 16 anos desde aquele primeiro dia. Muita coisa mudou, a minha ideia e ideal de Biblioteca transformou-se radicalmente e diversificou-se, como pessoa também mudei muito. O território e as Pessoas, essas, mantêm-se iguais com os mesmos problemas, potencialidades e amabilidades. Quero e gosto de acreditar que ao longo destes 16 anos contribuímos, com uma gota de água ou um grão de areia de bem estar e felicidade para transformar o quotidiano destas terras e gentes. Quero muito e gosto muito de acreditar que assim foi.
Os próximos passos....(pergunta difícil!). Tenho imensa Vontade de continuar a ser bibliotecário-ambulante, as Bibliotecas itinerantes são viciantes e uma "doença" que infecta e de cura difícil. A minha vida mudou, deu trambolhões imensos, as prioridades passaram a ser outras e, por isso mesmo, tenho reflectido imenso sobre o meu futuro e do meu filho Tomás. Trabalhar longe de casa acarreta logísticas difíceis e, por isso, sem procurar cura para essa doença das Bibliotecas Itinerantes, estou receptivo a um quilómetro 0 noutro projecto e desafio. Caso ele não surja, continuarei "infectado" e a tentar "infectar" mais uns quantos nestas estradas, nestas terras e gentes.
P.S. Se quiserem acompanhar o Nuno nesta viagem com a Bibliomóvel, podem fazê-lo nas redes sociais e em www.opapalagui.blogspot.com .