sexta-feira, 6 de junho de 2014

Pedagogia da Lentidão

No último encontro das Conversas Pequenas de 2013/2014 falámos de livros para os dias compridos que se aproximam, aqueles que podem ser explorados um pouco de cada vez, ou cuja leitura se pode estender por vários dias, enfim, histórias tão boas que nos dão inúmeras ideias para as ampliarmos com os nossos alunos / com as nossas crianças.

 
 
Um dos livros que levei foi História de um caracol que descobriu a importância da lentidão, do chileno Luis Sepúlveda, com ilustrações de Paulo Galindro. E esse livro levou-me a falar da Pedagogia da Lentidão, conceito introduzido pelo pedagogo italiano Gianfranco Zavalloni e desenvolvido no seu livro La Pedagogia della lumaca: per una scuola lenta e non violenta, de 2008. Como a conversa suscitou grande interesse, aqui vai o meu contributo para aprofundar o tema.
 
via
 
Neste livro, Zavalloni parte da constatação de que a escola atual segue o ritmo da vida moderna - um tempo feito de velocidade, de pressa, de aceleração - e reconhece a necessidade didática de abrandar. Propõe, assim, um novo modelo pedagógico a que metaforicamente deu o nome de "pedagogia do caracol". Segundo Zavalloni, é necessário perder tempo, para ganhar tempo. Para fazer de cada instante algo precioso para o aluno. Levando-o a:
 
escutar
dialogar
brincar
caminhar
observar
experimentar
esperar
crescer
 
Insiste na importância e nos benefícios da prática da caligrafia, com estilográfica, relativamente à motricidade fina, à retenção de informação e à criação de novas ideias. ( A este propósito, há três dias, o New York Times publicou um artigo interessantíssimo e muito bem fundamentado sobre este assunto). Em tempo de e-mails e sms, Zavalloni propõe a escrita de cartas e postais, como verdadeiras mensagens artísticas. Demonstra ainda que as fotocópias para pintar e as fichas são a morte da expressão artística. Relata igualmente a importância do trabalho criativo manual.
Afirma que andar a pé é a única maneira de conhecer a fundo o espaço onde nos inserimos e que fazê-lo em grupo permite viver emoções, notar pormenores que nunca veríamos ao passar, velozes, de carro, sentir os cheiros e experimentar sensações que criam laços. Diz que uma excecional escola de poesia é deitar-se na relva e observar as nuvens, imaginando formas e movimentos. Mas também é muito bom olhar lá fora, pela janela.
Interroga-se sobre porque dizemos "mau tempo". Não será uma questão de nos vestirmos bem para recebermos as nuvens cinzentas? Não serão a chuva e a neve abundantes bênçãos do céu?
Defende que cada escola possa ter uma horta, por mais pequenina que seja. De origem camponesa, este pedagogo que desapareceu cedo demais (faleceu em Agosto de 2012) conhecia o tempo ditado pela natureza, pelo ciclo das 4 estações, pelas sementeiras e colheitas. "Na época do tempo sem espera" é essencial compreender o valor das pausas fecundas.
 

Mais do que um modelo pedagógico, as suas são sugestões didáticas de desaceleração, assentes em escolhas simples, mas corajosas, que implicam simplificar, refletir, estabelecer prioridades e envolver as famílias através de pactos educativos. Já sei, estão a pensar nos programas para cumprir. Pois bem, quem me conhece, sabe que é isto que eu digo todos os dias. Talvez se eu citar Gianfranco Zavalloni vos soe melhor:
 
"Podemos mudar a escola sem necessidade de um ministro que nos venha com indicações ou imposições."

Acreditava que a mudança na escola pode acontecer todos os dias nas salas de aulas, graças aos bons professores, os que são conscientes, corajosos e esperançosos.

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